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Tânia Fator

Filha de italianos imigrantes operários, nasceu na Mooca, bairro tradicional de São Paulo. Começou a trabalhar cedo aos 12 anos em um escritório de contabilidade perto de sua casa. Tânia queria ajudar a entender/compreender as pessoas e ajudá-las, foi então que escolheu o curso de Psicologia na Universidade de Mogi das Cruzes; na época, já trabalhava em um banco no departamento de relações industriais como recepcionista. Graduada, ainda no banco foi do setor de recrutamento para o de treinamento ao qual gostou muito e a motivou a estudar Pedagogia. Uma professora, dona Gaetana, a convidou para trabalhar como diretora na Fundação Bem Estar do Menor e foi nessa experiência em que se apaixonou pela Educação. Após esse desafio, prestou concurso para dar aula no Estado, foi selecionada e lecionou no magistério; e também prestou concurso para a prefeitura, selecionada e lecionando para o primeiro ciclo. Depois do nascimento da sua filha, fez o mestrado e teve seu primeiro emprego no ensino superior, para o qual deixou outras duas escolas. Sua cunhada desejava que seu irmão compartilhasse o conhecimento acumulado pelos anos e prestasse concurso no então IMES, mas ele indicou para a irmã, Tânia; assim iniciou a sua jornada no IMES nos anos 1990.  Após ficar afastada da USCS por motivos pessoais, participou da criação do projeto pedagógico do curso de Psicologia e é a gestora do curso.
Imagem do Depoente
Nome:Tânia Fator
Nascimento:05/07/1954
Gênero:Feminino
Profissão:Psicóloga
Nacionalidade:Brasil
Naturalidade:São Paulo (SP)

TRANSCRIÇÃO DO DEPOIMENTO DE TÂNIA FATOR EM 13/06/2017
Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Tânia Fator, 62 anos.
Laboratório Hipermídias USCS, 13 de junho de 2017.
Entrevistador: Luciano Cruz
Transcritoras: Pamela Silva Carvalho e Laura Gouveia Nunes de Sousa.


Pergunta:
Gostaria que você começasse falando seu nome completo, local e data de nascimento.


Resposta:
Eu me chamo Tânia Fator, nascida na Mooca, em 05 de setembro de 1954, estou com 62 anos.


Pergunta:
Tânia, fala um pouco sobre as recordações que lhe vêm à mente nesse momento sobre a sua ____, a sua família... Como foi esse comecinho de vida na Mooca?


Resposta:
Eu sou filha de operários, de italianos operários imigrantes. Da parte da minha mãe, a minha família chegou à Mooca em 1880, 1885, já direto na Mooca, eles eram já trabalhadores de fábrica mesmo, vieram para trabalhar na fábrica. Da parte do meu pai, eles vieram um pouco antes porque vieram na imigração que levava para o interior, para as fazendas de café e o meu bisavô, que foi o que veio direto para Descalvado, uma cidadezinha no interior de São Paulo, pertinho de São Carlos, Araraquara... A família do meu pai está por lá ainda, na verdade, ainda tem apenas uma irmã viva deles, eram catorze irmãos, meu pai infelizmente já faleceu também, e tem só uma tinha minha agora que está viva, mas a família é enorme, tem pessoas que nós não conhecemos. Meu pai era o décimo terceiro, então quando ele nasceu o irmão mais velho, os dois primeiros irmãos já eram casados e tinham filhos. Então era uma família muito... E cada um tiveram dez, doze, catorze... Uma família grande demais, os ‘Fator' são grande. Da parte da minha mãe são os ‘Barone', uma família menor, mas que ficam na Mooca e continuam na Mooca até hoje. E eu também fiquei na Mooca, como a mãe queria, eu fiquei na Mooca também.


Pergunta:
Como era sua casa? Como era o convívio?


Resposta:
Ah, era todo mundo junto, aquela coisa de uma casa do lado da outra, quando não, duas casas dentro do mesmo quintal, porque os italianos têm esse hábito de morar todo mundo junto, fazer uma vila, e a gente chama de cortiço, nós brasileiros apelidamos essa questão de cortiço, os italianos gostaram dessa ideia de cortiço, trouxeram para cá essa ideia e eu me lembro de que quando criança eram todos os primos brincando juntos no pátio, as mães lavando roupa no tanque comum, todo mundo ia para a mesma escola, então ia aquele grupo de criança, todo mundo junto, todas as escadinhas, né, porque tinha desde o pequeninho até o mais velho ia todo mundo junto. Foi uma infância muito gostosa porque a gente brincava na rua, jogava queima na rua, jogava futebol na rua... Foi uma infância bastante feliz, bem solta, como uma infância tem que ser bem... Eu acho que o fato de nós não termos muitas... De ser uma família muito humilde, uma família de operários, não tínhamos grandes preocupações com etiquetas sociais, com roupa, com limpeza né... Com a coisa mais quadradinha de quem tem certo padrão mais elevado, e isso fazia da gente pessoas muito livres, muito afetuosas né, então era assim: todo mundo brigava e todo mundo dava risada, todo mundo comia, tudo se fazia sempre juntos... E a gente mantém isso, a família continua desse jeito, os primos, os irmãos, nós continuamos fazendo da mesma maneira, as coisas continuam assim.


Pergunta:
São quantos irmãos?


Resposta:
Eu tenho um irmão só. Meu pai foi o... Como meu pai era o mais novo de todos, os números de filhos dos irmãos [5'] foram diminuindo, chegou ao meu pai e na minha... A minha tia Ângela não teve nenhum filho, que era a mais nova de todas. Meu pai teve dois, o outro teve três e o mais velho tinha vinte... [risos]


Pergunta:
Você citou a questão da escola né, de todos os primos estarem indo juntos... Fale-me um pouquinho sobre como era para você o início da vida escolar.


Resposta:
Tem algumas coisas que são muito importantes em uma família italiana, essa questão da dedicação ao estudo na família era muito importante, porque era a válvula, era o caminho que ia fazer com que a gente tivesse uma vida melhor. Meu pai estudou muito e dava esse exemplo para a gente dentro de casa, eu sempre fui muito estudiosa, meu irmão também foi, todos nós, os primos... Todos nós nos dedicamos muito a esse tipo de coisa porque nós éramos ensinados que esse era o caminho para o nosso progresso. Então todo mundo gostava muito da escola, todo mundo dava muito valor, a escola era um bem, era um grande benefício para nós, era o lugar em que a gente podia ir construir o nosso futuro.


Pergunta:
E como foi essa trajetória até o início da vida profissional?


Resposta:
Bom, o início da vida profissional não ficou tão longe disso não. Eu comecei a trabalhar quando tinha doze anos de idade. Como uma boa família italiana, a gente começa a trabalhar cedo. A minha mãe tinha uma preocupação muito grande comigo e com meu irmão porque ela trabalhava também, de nós ficarmos sozinhos em casa, sem ter muito o que fazer então ela, rapidinho, encontrou uma coisa para eu fazer... A diferença para o mim e o meu irmão são de quatro anos, eu comecei a trabalhar primeiro, quando o meu irmão chegou lá pelos doze anos, foi trabalhar também. Eu fui trabalhar em um escritório de contabilidade que tinha ali perto da minha casa, na qual meu pai era amigo do dono do escritório, e eu que tinha uma letra bonita, fui fazer o livro dos inventários, então eu passava o dia inteiro copiando nota, copiando... Porque tudo era feito à mão naquela época. Não tinha Xerox, não tinha nem mimeógrafo na época em que eu fui trabalhar aos doze anos de idade. Eu brinco com meus alunos que a única coisa que existia para a gente tirar cópia de alguma coisa, era um negócio chamado gelatina, era uma folha de gelatina fininha que você colocava em uma prensa, o papel escrito a mão, você colocava a gelatina e depois pressionava, aquela marca ficava na gelatina e depois você tirava, colocava uma folha em branco e pressionava de novo para sair a cópia, mas era uma coisa assim extremamente sofisticada que nós tínhamos naquela época né...


Pergunta:
Alta tecnologia né?


Resposta:
Alta tecnologia. Então comecei a trabalhar assim e nunca mais parei de trabalhar. Eu trabalho, junto ao estudo, que era e é ainda para gente... Tanto que eu passei para as minhas filhas, elas foram para o mesmo caminho de trabalhar, estudar e ter isso como uma questão de honra. Trabalho e honra são os dois valores italianos com os quais a gente liga então isso que me trouxe até aqui né, essa vida profissional aí. Eu fui estudar, fui fazer faculdade e eu me lembro de que eu queria fazer filosofia, e meu pai olhou para mim e falou: ‘Vai morre de fome né. Não. Não vai fazer filosofia, vai fazer direito', aí eu falei: ‘Não. Direito eu me nego. Não quero faze direito. Quero fazer alguma coisa que ajuda as pessoas de outro jeito, entender as pessoas. ', e estava naquela época aparecendo o curso de psicologia, era uma coisa nova, uma profissão nova, então eu fui fazer psicologia por conta disso, porque eu queria compreender as pessoas e ajuda-las, que até hoje é o que movimenta as pessoas para fazerem o curso de psicologia né.


Pergunta:
Como foi esse seu período da faculdade?


Resposta:
Foi bem tumultuado porque aí eu tinha que... Para quem não conhece direito São Paulo, talvez não tenha essa dimensão, mas para quem conhece principalmente a zona leste de São Paulo, eu morava em Sapopemba [10'], na Avenida Sapopemba, entre ______ e Sapopemba, que do centro da cidade fica mais ou menos a uns 15 quilômetros, eu trabalhava na Avenida Paulista, então eu saía de manhã cedinho, pegava um ônibus faltando quinze minutos para as 6h, que saía do ponto final, ia para a Avenida paulista porque entrava às 8h da manhã e fazia faculdade em Mogi das Cruzes, básico, simples assim... Saía 17h da tarde do escritório, pegava um ônibus até o Brás, pegava o trem, ia de trem, entrava na faculdade às 19h, ficava até às 23h, o trem saía às 23h em ponto, pegava o trem, chegava 23h45 no Brás de novo, meu pai estava me esperando e a gente voltava de ônibus para casa.


Pergunta:
Fez o UMC?


Resposta:
Fiz o UMC.


Pergunta:
Por que essa escolha pelo projeto?


Resposta:
Na verdade não foi uma escolha... A gente foi sendo levado a isso. Enquanto eu estudava - sempre estudei em escolas públicas - enquanto eu estava no período do segundo e terceiro que hoje é ensino médio e naquela época é colegial, várias faculdades foram fazer propaganda e a que me interessou foi a UMC porque estava começando a turma de psicologia, eles estavam falando que o curso era ótimo, que era bem equipado, que os professores eram da USP... Fiquei entusiasmada com isso, fui conhecer Mogi das Cruzes - eu nunca tinha ido até Mogi - realmente encontrei... O que eles tinham prometido era aquilo que estava lá mesmo, prestei o vestibular e passei. Eu tinha passado na PUC também, em São Paulo, mas a PUC demorou a entregar os resultados e eu fiquei com medo, ansiosa... Eu tinha 17 anos né, fiquei muito ansiosa naquela época, de: ‘Ah, e se eu não fizer a inscrição em Mogi eu vou perder, depois não vai ter... ' e fiz a inscrição em Mogi, aí não fui atrás da PUC, fiquei em Mogi.


Pergunta:
E como foi para alguém vir de uma família de operários, como você mesma citou que não tinha uma preocupação maior... Como foi ser universitária?


Resposta:
Ao mesmo tempo em que era uma coisa de orgulho... Como todos os primos foram à Universidade, para a família isso meio que ficou como um processo natural da vida. Os pais não tinham estudado muito, tinham estudado até um determinado ponto, e nós que éramos a geração nova, fomos atrás de fazer faculdade porque a faculdade tinha se democratizado, o ensino superior tinha se tornado mais democratizada nesse sentido. Então, ao mesmo tempo em que o pai e a mãe olhavam para gente e: ‘Nossa. Está fazendo faculdade. Eu tenho um filho que está fazendo faculdade. ', a família inteira ficava: ‘Não, essa geração é a geração da faculdade', então estava todo mundo trocando... Um primo com a prima, um fazia medicina, um fazia administração, outro fazia engenharia... Todo mundo foi fazer alguma coisa em termos de ensino superior. Acho que não tem nenhum primo nosso, dessa minha geração, que ficou fora, todos foram para... Porque era o nosso destino ali traçado pelos pais, como se os pais tivessem combinado e feito esse caminho para gente, e a gente seguiu.


Pergunta:
Nessa sua vida escolar tem algo que te marca ou que depois, já na carreira docente, você tenha se identificado, lembrado da sua experiência anterior?


Resposta:
Olha, tem. Têm algumas marcas interessantes, algumas histórias muito interessantes para contar... Como eu disse para vocês, eu fui fazer faculdade com 17 anos, fui fazer psicologia porque eu queria entender as pessoas. Eu já trabalhava na época que eu entrei na faculdade, estava trabalhando já no banco, no Banco Cidade de São Paulo, que depois foi comprado pelo Itaú, foi incorporado. [15'] E lá no banco eles já tinham meio que me direcionado para eu trabalhar aquilo que hoje eles chamam de RH, mas naquela época era chamado de departamento de relações industriais, esse era o nome do RH no passado. Eu fui ser recepcionista lá, por isso que eu me interessei também e fiquei sabendo da psicologia, que era uma coisa nova... Tinha uma psicóloga trabalhando lá, ela me influenciou muito, porque ela era estudante da psicologia da USP no período da ditadura e ela era muito articulada, então ela vinha contando muitas coisas do curso... Ela era uma chinesa, chamava-se Yang-Ye-Fon e todas nos a chamávamos de Suzy... [risos] justo, porque ela parecia à bonequinha Suzy mesmo [risos], com aquele cabelinho lisinho... Bem bonitinha ela era. Enfim, eu me apaixonei pela psicologia por conta disso, então essa foi uma marca. Fazendo já, do primeiro para o segundo ano de psicologia, o banco abriu uma possibilidade de pedir transferência para um departamento que estava aparecendo no banco, que era o famoso CPD, Centro de Processamento de Dados, então era o início disso que hoje a gente sabe que é monstruoso na questão da tecnologia informacional. Naquela época eles estavam... Os bancos foram os primeiros fazer isso. Eles estavam montando o departamento, queriam funcionários que entendessem do projeto e que fosse trabalhar lá, e eu fui, falei: ‘Ah, quero ver que negócio é esse'. Fizeram um processo seletivo e eu entrei em primeiro lugar... Eu sempre detestei matemática, mas eu sempre fui muito boa de lógica, então eu tenho uma habilidade em lógica muito boa, mas não gosto da matemática. O teste seletivo, o processo seletivo era todo baseado na lógica, então eu acabei passando em primeiro lugar e porque eu estava fazendo psicologia, o que também me ajudou nisso. Eles me chamaram, deram-me um monte de coisa, falaram: ‘Você vai fazer essas coisas aqui, vai fazer esse curso, vai estudar isso, vai vir não sei quantas vezes aqui, porque nós vamos fazer de você uma analista de sistema. Você vai ser u uma das primeiras analistas de sistema que já vi no mercado... ', eu falei: ‘Ah, legal né, bacana esse negócio. Mas como eu vou usar psicologia nisso?', ‘Não. Você não vai usar psicologia. Você terá que abandonar a faculdade de psicologia e entrar em uma faculdade de matemática', eu disse: ‘Aham, está bom. Pode chamar o segundo lugar' [risos]... Esse negócio de CPD para mim não tem futuro. Então essa foi uma das coisas boas da carreira, eu fiz a escolha que eu sabia que eu queria e aí não balancei, na hora em que ele falou: ‘você tem que deixar a faculdade de psicologia', eu disse: ‘Não. Não vou deixar. '


Pergunta:
E você voltou para o RH?


Resposta:
Voltei para o RH, para o departamento de relações industriais. E fiquei no RH, fiz carreira dentro do RH, eu me aposentei... Faz uns 10 anos que eu estou aposentada mesmo, um pouco mais, acho que uns 12 anos que eu estou aposentada, mas eu me aposentei no RH, fiz toda uma carreira executiva dentro do RH. Fui consultora, continuei fazendo algumas consultorias e eu me dediquei à psicologia organizacional.


Pergunta:
Como foi a docência?


Resposta:
Então... A docência é outra história muito engraçada. Antes de eu ir para a faculdade, o meu pai queria que eu fizesse alguma coisa para ganhar dinheiro, virou para mim e falou assim: ‘O que você está fazendo nesse colegial aí, o que você está estudando?', eu contava para ele o que estava estudando, que eu gostava de filosofia... ‘Por que você não vai fazer o normal ao invés de você fazer esse negócio aí? Você está perdendo tempo com isso. Você tem que fazer alguma coisa que te de uma profissão. ' [20'] Porque naquela época não chamavam nem de magistério, era normalista, curso normal que era para se formar professora, e a resposta que eu dei para o meu pai foi: ‘Nunca serei professora'... Mordi a língua feia, enfim. Aí fui para a faculdade de psicologia. Na faculdade de psicologia a gente tem... Naquela época tinham três cursos paralelos que nós podíamos fazer - hoje são só dois - que era o bacharelado, a formação de psicólogos e a licenciatura em psicologia, eram três habilitações que naquela época eles chamavam. Hoje tem só o bacharelado, que é mais extenso e é bacharelado de informação, e tem a licenciatura que é opcional, naquela época também era opcional. E aí me convidaram: ‘Vamos fazer licenciatura', amigas, todas: ‘Ah não, vamos nos inscrever, saímos com dois diplomas, diploma de psicólogo e diploma de professor... ', ‘Não vou ser professora. Não quero ser professora. ' E passou. Formei-me psicóloga, continuei trabalhando no RH, aí eu fui transferida... Eu estava já no Banco do Itaú e fui transferida para trabalhar no treinamento, no departamento de treinamento do banco, saí do recrutamento de seleção, da onde eu estava, e fui ao treinamento. Quando cheguei ao treinamento eu fui à sala de aula, fui dar treinamento para as pessoas e eu me apaixonei. Falei: ‘Eu preciso saber mais disso. Preciso saber mais sobre esse negócio de ensinar. Eu não sei nada de ensinar, na faculdade de psicologia eu não fui atrás... ', aí eu vou... Mexi, mexi, mexi... Falei: ‘Vou fazer pedagogia'. Eu fui para a faculdade e fui fazer pedagogia. Na faculdade de pedagogia, como eu já estava formada, já tinha uma formação, fui fazer a faculdade de pedagogia mais velha e com conhecimento de psicologia, as colegas em torno de mim começaram a me pedir: ‘Tânia me ensina isso que eu não entendi', ‘Ensina-me aquilo que eu não entendi', ‘Aquela professora não sabe falar, você sabe falar melhor que ela'... Conclusão: eu comecei o magistério dentro da minha própria sala de aula em formação com as minhas colegas de pedagogia, aí eu me dei conta de que eu realmente era professora. Quando eu estava me formando, uma das professoras, a mais velinha das professoras chegou para mim e disse assim: ‘Eu tenho uma escola para você ir trabalhar', falei: ‘Não professora, eu não quero trabalhar em escola', ela falou: ‘Quer sim. Vai sim. Eu estou precisando que você vá trabalhar em uma escola e eu vou por você para trabalhar lá', era uma italiana daquelas duras, bem bravas, dona Gaetanea, uma graça... Ela era supervisora de ensino: ‘Você vai sim porque é uma escola boa, você tem todo o jeito para ir lá e você vai ser a diretora da escola!', eu falei: ‘AH! Dona Gaetanea... ', ‘Não. Você vai!', eu fui trabalhar... Meu primeiro emprego como professora, que na verdade nem foi como professora porque fui como diretora, como pedagoga, e fui trabalhar em uma escola da FEBEM. E aí eu me apaixonei pelo negócio... Porque aí eu percebi o quanto a educação é mobilizadora, o quanto a educação traz... Este sonho, ela traz a ferramenta que a gente precisa para que as pessoas possam se formar, para que as pessoas possam ser alguém, possam se desenvolver como pessoas. A psicologia explica, compreende o que se passa nas pessoas, nas relações que as pessoas têm umas com as outras, em alguns momentos ela cuida para que isso seja melhor, mas é o processo educativo, é o processo educacional que é a ferramenta de desenvolvimento, se não passar pela educação... Tanto que eu, depois disso, entendi naquela época e continuo entendendo até hoje que o processo terapêutico é um processo de aprendizagem, onde eu aprendo a ser eu mesma, o melhor processo de educação que a gente tem é o processo da psicoterapia.


Pergunta:
Fala um pouquinho dessa sua experiência, como você chegou à escola... Para quem não ia dar aula, você chegou lá e ___________________________...


Resposta:
Ah essa aqui é a nova diretora, né...


Pergunta:
Como foi esse início aí? [25']


Resposta:
A dona Gaetanea conseguia perceber em mim uma pessoa que enfrentava desafios, eu sempre gostei de desafios, eu sempre gostei e novidade. Aquilo se eu via uma coisa que... Eu tenho uma curiosidade muito grande pelas coisas, então se eu vejo que tem algo que eu possa fazer e que eu nunca fiz, é lá que eu vou estar, porque eu tenho muito este perfil psicológico. Então, na hora em que a dona Gaetanea, disse assim: ‘Você vai lá porque você vai ser diretora', que eu cheguei à escola e tinha tudo por fazer, porque eram 400 meninos que eram atendidos... Naquela época não era FEBEM, naquela época era Fundação de Bem-Estar do Menor...


Pergunta:
Mas é esse nome, não é?


Resposta:
É. É. Era outro nome... Era... Acho que era Fundacentro, se eu não me engano, mas logo em seguida mudou o nome, depois virou Fundação Casa... E eles tinham um... Eles têm até hoje um projeto dentro da fundação que são crianças que estão desamparadas, mas que ainda tem um membro de família, ou uma avó, ou um tio, uma tia, ou uma irmã mais velha... Tem um membro de família e tem uma casa para morar, tenha uma brigo ainda. Então eram esses meninos... Eram apenas meninos. E era uma escola ligada, que tinha uma parceria com uma fundação, com uma ONG chamada Casa do Pequeno Trabalhador, que tinha uma gráfica/escola, então os meninos eram divididos em dois grupos, 200 meninos de manhã, 200 meninos à tarde, e os meninos que estudavam na escola de manhã, á tarde iam para a gráfica aprender uma profissão, e vice-versa, os meninos que estudavam à tarde, ficavam de manhã na gráfica. Depois eles tomavam café da manhã na escola, almoçavam na escola e no final da tarde, eles voltavam para casa, com os pequenininhos alguém da família ia buscar e os maiores iam embora sozinhos para as suas casas. Então eles não eram internos, mas eles estavam em medida socioeducativas. Quando eu cheguei à escola estava tudo por fazer, a antiga diretora não tinha se dado bem naquele lugar, a escola tinha ficado por muito tempo sem direção, os professores estavam fazendo tudo o que podiam, mas estavam todos desarticulados porque não havia alguém que integrasse o trabalho, tinham outros funcionários, tinha que ter limpeza, tinha cozinha, tinha cozinheira, tinha ajudante de cozinha, tinha zelador porque ficava em uma rua enorme ali na Tamandaré, na Liberdade, que era um daqueles casarões antigas, dos coronéis do café que não tinham herdeiros e acabaram deixando a casa para uma bem-feitoria... Então era uma casa que tinha sido destinada para ser uma escola. Mas era um casarão, daqueles palacetes perto da Paulista, bem antigos, deteriorados, com porão... Então tinha toda uma preocupação. Eu entrei e a primeira coisa que eu falei foi: ‘Isso aqui precisa de limpeza. Vamos limpar tudo!', ‘COMO ASSIM?', ‘Vamos limpar! Ninguém pode trabalhar ninguém pode ser uma boa pessoa, ninguém pode aprender a ser um bom cidadão morando na sujeira, estudando na sujeira, vivendo na sujeira. ' coisa de italiano, né? Foi o que eu aprendi com a minha mãe, mais do que aprendi na escola, aprendi com a minha mãe. No primeiro mutirão que nós fizemos, passamos uma semana faxinando aquele casarão... Saiu até rato ali de dentro. Ai quando os meninos voltaram - porque assim, era uma semana de feriado, alguma coisa assim - Quando os meninos voltaram, eles olharam, ficaram meio desconfiados... Aí fiz uma reunião com todos, fui de sala por sala conversar com eles, falei: ‘Olha, está limpo, então vamos ter que conservar. Então se vocês sujarem, vocês vão ter que limpar [30'] porque nós também estamos limpando, então a gente faz a nossa parte e vocês fazem a de vocês' e no começo deu aquela confusão mesmo, eles brigavam, pegavam o giz e jogavam tudo, jogavam papel... Porque eles ao tinham sido educados para estar em um lugar limpo. Nos primeiros movimentos não tinha dúvidas, eu ia lá... ‘O que nós combinamos?', ‘Que nós íamos limpar', ‘Então vocês vão limpar. O professor vai entrar, vai estar em sala de aula e vocês vão limpar a bagunça de vocês. Tudo bem?' [murmurinhos de reclamação], ‘Não tem outro jeito. Ou faz isso, ou não tem mais aula, o que podemos fazer?', ‘Está bom, tudo bem'... Eu nunca tive grandes problemas, tinha um ou outro que era mais rebelde, que tinha problemas de aprendizado, tinham problemas psicológicos, emocionais, mas ai a gente lidava... Tinha uma assistente social que trabalhava junto, que era bem bacana e com quem a gente fez uma parceria boa... E a gente que cuidava dos meninos. Eu passei dois anos nessa escola, foi a minha primeira experiência como docente.


Pergunta:
E já começou como diretora?


Resposta:
É. E aí foi... É engraçado porque assim, eu fui diretora, prestei concurso e entrei no estado para ser professora, porque aí eu falei: ‘Bom, já que eu estou né, vamos prestar concurso'... E eu saí depois de dois anos porque a Fundação Casa do Pequeno Trabalhador se desmontou e os meninos foram transferidos para o estado, para uma escola do estado que tinha ali do lado... Aí eu prestei concurso para entrar no estado, porque se eu entrasse, ia dar aula lá, ia continuar dando aula para eles, mas pela classificação que eu peguei, eu não consegui dar aula naquela escola. A primeira escola do estado que eu fui dar aula foi lá na Água Rasa, perto da onde eu morava lá na avenida Sapopemba.


Pergunta:
Você foi dar aula para quem?


Resposta:
Fui dar aula para o magistério. Porque o desafio era esse: ‘Como eu faço para os professores entenderem que eles são os responsáveis pelo futuro das crianças?', porque aí como eu olhava com uma olhar de direção, o meu olhar de diretora era esse: ‘Eu preciso preparar os professores. Os professores estão mal preparados'.


Pergunta:
O que também não é fácil...


Resposta:
O problema não é o aluno, o problema é o professor.


Pergunta:
Como você preparou as aulas para os professores?


Resposta:
Eu fui aprender, fui lá olhar, fazer formação, começar do começo. O pessoal que escolhia fazer o tal do magistério, que eu tinha falado para o meu pai que eu não ia fazer, agora eu dava aula para eles, né. E aí eu contava as experiências: ‘Olha, os alunos eram assim, eles faziam isso, dava certo quando o professor fazia dessa maneira, quando o professor não fazia, não dava certo... ' E aí eu fui me apropriando dessas coisas e fui formando professores. Fui ser professora para aprender a ser professora também, junto àquele pessoal. Aí o desafio foi nessa escola dar aula para o ginásio, porque a divisão era: primário, ginásio e colegial, falei: ‘Bom, vamos lar, vamos ver no que dá', porque tinha uma disciplina naquela época na última série do ginásio que era o Programa de Formação Profissional, um programa de orientação vocacional e, como eu tinha psicologia e pedagogia, eu era, dentro da escola, a capacitada para dar esse tipo de atividade, essa aula para os alunos que estavam na oitava série, aí eu fui dar aula no ginásio. Nesse meio tempo eu prestei concurso para entrar na prefeitura, só que na prefeitura eu fui dar aula para o primeiro ciclo da primeira quarta, então fui dar aula para a quarta série... Fui descendo, aí fui dar aula para a quarta série. Professora primária mesmo.


Pergunta:
E a área de diretora executiva...


Resposta:
Paralelo, fui seguindo, fazendo as duas coisas juntas.


Pergunta:
Dormindo às 3h da manhã...


Resposta:
Ah... Tranquilo... Sem problemas... Para quem estudou em Mogi por cinco anos, aquilo era fichinha. Aí fui trabalhar. Trabalhava no estado, no ensino médio e trabalhava na prefeitura no ensino fundamental.


Pergunta:
E no Itaú?


Resposta:
E aí, durante o dia, no Itaú. Fazia essa conversa aí... Aí eu saí do estado... Fiquei só... [35'] Ah! Aí na prefeitura vagou o lugar da diretora... Claro que as coisas não acontecem por acaso. ‘Ah! Quem pode ser a diretora? Quem tem a experiência de diretora?'[...] Era a Tânia que estava lá naquele momento. Aí eu fui ser diretora lá em São Matheus, com uma população parecida com a minha população, com quem eu estava acostumada a trabalhar, com quem eu tinha começado a trabalhar, e foi uma experiência muito boa.


Pergunta:
A distância nunca foi problema para você né?


Resposta:
Não. Nunca me segurou também. Essas coisas nunca me seguraram não. Bom, eu sei que eu fiquei nessa experiência até... Quando que eu fui sair da prefeitura... Ah! Eu saí da prefeitura na minha segunda gravidez, porque eu precisava me afastar, trabalhei até o quarto, para o quinto mês, e aí eu precisei parar, pedi um afastamento normal, que eu tinha direito a fazer e nesse afastamento a minha filha nasceu eu já estava fazendo mestrado em educação na PUC... Em meio a essa bagunça toda, eu ainda estava estudando, nunca parei de estudar.


Pergunta:
E você tinha tempo?


Resposta:
Sobrava tempo ainda... E como eu estava fazendo mestrado, eu fui convidada a dar aula na faculdade. Então ai eu saí eu sai da prefeitura, saí do estado e comecei a dar aula. O meu primeiro emprego de ensino superior foi na Anhembi Morumbi, porque eu tinha uma colega que trabalhava lá e estava fazendo mestrado junto e que me levou, me convidou para ir dar aula lá, eu fui, passei no processo seletivo e fiquei dando aula no ensino superior, aí fui dar aula de psicologia aplicada na administração.


Pergunta:
Como você fica sabendo da USCS e como você chega à USCS?


Resposta:
Essa história da USCS é engraçada porque a minha cunhada, esposa do meu irmão, queria muito que o meu irmão começasse a dar aula, porque o meu irmão também foi... Só que o meu irmão fez carreira no banco, foi gerente de banco, fez carreira executiva de banco... Contador, economista, finanças né, e chegou lá em um determinado momento que a minha cunhada falou assim: ‘Ah, não. Tem que ir dar aula, você sabe tanta coisa, tem que compartilhar'... E eles moravam aqui pertinho, eles sempre moraram aqui na Vila prudente, quase em São Caetano, na Vila Alpina, ali na passagem para São Caetano e minha cunhada anda muito por aqui, sempre andou por aqui... E saiu no Diário do Grande ABC, a publicação de um concurso para professores.


Pergunta:
Você está falando, mais ou menos, de...


Resposta:
1995. O primeiro concurso que teve na USCS, que não era USCS, era IMES. A primeira vez porque assim, o IMES se enquadrou na lei, houve uma reforma no ensino superior, e as instituições, mesmo as públicas e as _______, precisavam a partir de então fazer então concurso para o ingresso.


Pergunta:
Isso aí eu acho que foi em 1998, né?


Resposta:
Isso. E com as leis complementares, fizeram um concurso interno para acertar a vida dos professores que já trabalhavam aqui, para classificar esses professores e aí abriram o primeiro concurso externo, que foi o primeiro concurso que eu fiz em 1995. E a minha cunhada recortou esse anúncio e mostrou para o meu irmão, e ele falou: ‘eu não quero dar aula não, isso é coisa da minha irmã. Dá lá para minha irmã que ela gosta da educação', e me passou o papel. Aí eu vim, com a cara e a coragem. Eu não sabia aonde era a USCS, eu não sabia aonde era São Caetano... Não! São Caetano eu conhecia obviamente, mas eu não sabia aonde era o IMES, não conhecia ninguém aqui dentro... Eu vim, como sempre, do jeito que eu sempre fiz tudo, com a curiosidade, com a cara e a coragem, enfrentando o desafio. [40'] Aí eu cheguei aqui e todo mundo olhava para mim: ‘O que você vai fazer?' ‘Eu quero ser professora de psicologia' ‘Ah, professora de psicologia... Mas essa é uma escola tão conservadora... Os meninos gostam mais de homens dando aula para eles'. Tinha meia dúzia de professoras só, em 1995.


Pergunta:
Você fez o concurso para qual disciplina?


Resposta:
Psicologia. Psicologia aplicada à administração.


Pergunta:
Ah, por conta do curso tinha administração?


Resposta: Só tinha curso de administração naquela época. Ainda não tinha... Acho que economia começou um pouquinho depois...


Pergunta:
Acho que economia já tinha.


Resposta:
Não! Tinha sim... Economia eu não sei. Acho que tinha administração e comunicação. Comunicação já tinha... Acho que comunicação apareceu naquele ano, em 1995, 1996, por aí. Eu lembro que eles abriram o concurso e tinha psicologia aplicada para dar aula em todas as psicologias de todos os cursos... E, bom, enfim... Eu prestei o concurso, passei e fui chamada.


Pergunta:
Como era aquela instituição que você encontrou aqui em 1995?


Responda: Ah... Olha, desde o começo foi sempre muito bom. Sem puxar o saco da USCS, né, mas sempre foi... Assim, tem uma coisa bem marcante que é muito interessante, que me deixou... Que me marcou... No primeiro mês, segundo mês de trabalho, ainda conhecendo todo mundo, os professores na sala dos professores... A Adelci, claro, sempre a professora Adelci: ‘Oi, como vai? Tudo bem? Eu estou aqui há dois anos' Acho que ela estava aqui há dois anos quando eu ingressei. ‘Vamos conversar, vamos fazer a mesa das meninas' [múrmuros simulando conversa] ‘Eu vou te apresentar as pessoas'. E aí ela saiu me apresentando os professores do lugar e me apresentou o professor Santander... E o professor Santader disse assim: ‘Ah é, psicologia? Bacana, estamos precisando mesmo de gente que dê psicologia. Esses meninos precisam aprender psicologia mesmo'. Eu virei para ele e fiz: ‘Mas e a faculdade? Como que é? É bom trabalhar aqui?' E ele respondeu: ‘Só vou te dizer uma coisa. Depois que a gente começa a trabalhar aqui fica mal acostumado'... E olha, é verdade. Porque eu trabalhava na Anhembi Morumbi... Eu trabalhei em muitos lugares, gente, muitos, como professora... Eu trabalhei na FAAP, eu trabalhei na FGV, Fundação Getúlio Vargas aqui de São Paulo, eu trabalhei na... No Sumaré, Instituto Sumaré... Na Unicsul... Não! Unicsul não. Na UNINOVE [...]. Bom, enfim... Fui fazer muitas coisas em muitos lugares... Eu nunca encontrei uma estrutura igual do IMES... O IMES era uma família, né. Era a família italiana de novo e eu me sentia muito a vontade aqui porque as pessoas eram... Setenta por cento, 80 por cento de professores e funcionários eram tudo italianos de São Caetano... Então a gente brincava muito, brigava muito, brincava muito, fazia tudo junto. Comia junto, bebia junto, aquelas coisas que eu sempre fiz, que eu sempre soube... E nós sempre fomos muito solidários... É uma coisa muito interessante porque... Com o passar do tempo nós vamos percebendo que a USCS tem as panelinhas como todas as organizações têm. Mas, mesmo as panelas, se organizam... Elas têm intersecções, têm integrações entre si. Sempre tem uma ou outra pessoa que faz a ponte entre as coisas... E em todos os momentos que a USCS precisou todos estavam juntos. Todos estavam juntos trabalhando pela USCS. Então é como se fosse mesmo uma coisa do coração, que a gente vai aprendendo a amar vai aprendendo a conviver e, quando percebe... [45'] Está aqui, faz parte. Eu não sei dizer... Quando alguém pergunta para mim: ‘Professora de onde?' ‘Eu sou professora da USCS'...


Pergunta:
Isso aparece muito nas pessoas que nós temos conversado. Essa questão da família, essa questão da união, né... Que você falou... Tem n outras pessoas que chegam à mesma conclusão e isso me parece ser algo realmente muito ligado a esta instituição.


Resposta:
É cultural mesmo.


Pergunta:
Você tem algum exemplo prático, algo que você viveu que possa exemplificar essa relação que existe entre as pessoas que aqui militam?


Resposta:
Olha... Deixe-me ver, no dia a dia, o que a gente [tosse]... ____ Não sei, é nisso que estou pensando. Nós temos uma coisa da APROXIMES, da Associação dos Funcionários. O próprio nome da Associação dos Professores já é um nome que leva isso... Não é atoa que ela chama APROXIMES, exatamente com essa intenção. O próprio logo é um monte de flechas para o A, todo mundo junto ao mesmo tempo. E... Todas as vezes que participamos de algo que precisava... As grandes mudanças que a USCS passou sempre foi uma relação de colegiado, sempre foi feito no conjunto. Claro que tem diferenças, tem pessoas que são mais comprometidas, mais engajadas e tem outras que vão olhando mais de longe, pelas próprias características de personalidade de cada um. Mas as coisas sempre foram feitas muito juntas, de dar palpite, de participar, de olhar... Eu me lembro no período de constituição da universidade nessa passada de sair do Instituto de Educação Superior para ir para Centro Universitário, depois passar... O quanto a gente se empenhou, o quanto participou das visitas que o MEC veio... E todo mundo: ‘Você vai falar isso' ‘Você vai falar desse jeito' [múrmuros simulando conversa]. Todo mundo empenhado em fazer com que as coisas acontecessem da melhor maneira possível, sem ninguém pedir. Não é que alguém, um chefe, chegava e falava: ‘Olha, agora nós precisamos'... Não. As coisas já eram naturais. Nós vamos fazer porque esta é a nossa casa e nós precisamos cuidar dela. Então acho que tem em tudo: para fazer as festas, para fazer os... Assim, a gente foi... Eu acho que talvez da um saudosismo hoje porque estou aqui há 23 anos. Dá um saudosismo porque antes era um grupo menor. Nós conhecíamos todos, conhecíamos a família de todos e era praticamente um único grupo porque eram poucas pessoas, então dava para olhar... Hoje a gente não sabe, não conhece todo mundo, não sabe o nome de todo mundo, a USCS está muito grande. Nós temos 300 e poucos professores já... Na época nós éramos 70. Quando eu entrei eram 70 professores, né. Não tinha um curso de direito ainda, o curso de direito veio depois. Não tinha Ciências Contábeis que são os mais tradicionais... Bom, enfim.


Pergunta:
Toda a área da saúde.


Resposta:
A área da saúde veio bem depois. A área da saúde veio depois que virou Universidade mesmo.


Pergunta:
Fale um pouquinho sobre a criação do curso de psicologia que você acompanhou tão de perto.


Resposta:
Essa é outra história engraçada porque eu não acompanhei de perto, não.


Pergunta:
Olha como é bom um projeto como esse. __ senso comum.


Resposta:
[risos] Para quebrar lendas, né... A história é assim... Eu passei por um período em 2014 [50']. 2013, 2014, foi um período muito triste da minha vida porque os meus dois, pai e mãe, adoeceram. O meu pai já vinha com uma doença, um Alzheimer, de muito tempo e minha mãe tomava conta dele... Minha mãe era uma pessoa bastante ativa e bastante lúcida com tudo, com todas as coisas que fazia. Quando chegou em 2013 a gente descobriu que ela estava com uma doença chamada DPOC. É uma sigla de uma doença pulmonar degenerativa da parede dos pulmões e é irreversível... Ela teve uma primeira crise de respiração, enfim. Por conta disso parou de cuidar do meu pai porque ficou internada e aí virou uma confusão porque era ela que cuidava de tudo... Eu comecei a cuidar. Eu já cuidava dos dois de longe e tive que me aproximar mais... Eu peguei um afastamento, uma licença não remunerada. Fiquei 2013 e 2014 afastada por conta dessas questões pessoais minhas... Meus pais faleceram. Minha mãe faleceu em março de 2014 e meu pai em julho de 2014, logo em seguida. No segundo semestre de 2014 eu tive que me cuidar porque eu já estava bastante debilitada, né, a minha saúde também estava bem ruim. Quem toma conta também fica doente... E para me fortalecer ___. Quando chegou ao final de 2014, em outubro, finalzinho de outubro e novembro, eu falei: ‘Ah, agora já estou bem, está na hora de eu voltar a trabalhar', e eu tinha largado todas as coisas que eu fazia até então. Porque eu tinha a USCS, mas tinha outras escolas, fazia consultoria, viajava... Eu tinha uma vida bastante diversificada em termos profissionais. Mas nesses dois anos eu fui me afastando de tudo e fiquei sem nada. No final de 2014 eu voltei para a USCS, e quando eu cheguei aqui estava o professor Bassi e o professor Biffi e eu disse para eles: ‘Olha, eu quero voltar ano que vem e queria ver se, por acaso, vocês podem me dar uma turma para eu voltar, para eu dar aula. Eu sei que vocês puseram outros professores nesses dois anos que eu estava afastada, mas eu queria ver se vocês me arrumavam uma ou duas turmas para eu voltar, para eu recomeçar a minha vida'... O professor Ruiz, que era o meu chef... Porque eu procurei pelo Ruiz, o Gestor da Tecnologia, que foi a última turma que eu tinha dado aula, até então. O Ruiz falou: ‘Ah, está bom, eu vou conversar com o Bassi e com o Biffi. Volta aqui semana que vem para conversarmos'. ‘Está bom'. Na semana seguinte quando eu voltei para conversar, o Ruiz falou: ‘Olha, não é comigo que você vai conversar você vai falar é com o Biffi' ‘Está bom'. Então eu subi para conversar com o Biffi. Eu trabalhei com ele a vida inteira porque a gente dava aula porta na porta. Ele dava aula de economia para administração e eu dava aula de psicologia para administração. E ele disse: ‘Ah, tudo bem? O que você está fazendo, onde você está trabalhando?' Falei: ‘Eu não estou trabalhando em lugar nenhum, estava afastada' Contei a história, um pouco que ele sabia. ‘Eu quero voltar, quero pelo menos duas turmas para eu voltar. Veja se você consegue duas turmas para mim'. Aí ele: ‘Não, não vou não' ‘Como assim não? O que custa você me dar duas turmas?' ‘Não, eu vou te dar um turma inteira' Eu disse: ‘Como assim?' ‘É que nós abrimos vestibular para psicologia para sentir o mercado, o mercado respondeu e nós temos duas salas de psicologia: uma de manhã e uma a noite. ' Então ele falou: ‘Porque a gente precisa... Você vai trabalhar... Quer assumir?' Eu fiquei: ‘Como assim assumir?' ‘É um desafio para você. Eu estou precisando de alguém que assuma a gestão do curso, que aceite o desafio'. Falou minha palavra mágica. Passei minha vida inteira correndo atrás de desafio e ele me conhece o suficiente para saber que eu ia aceitar. Falei: ‘Ah, o máximo que pode acontecer é dar errado, mas isso você já tem. Então vamos lá, vamos embora'. Aí eu passei e conversei com ele em... Acho que foi dia dois ou três de dezembro que nós tivemos essa conversa. [55'] No dia 15 de janeiro eu entreguei o projeto pedagógico do curso, os professores do primeiro semestre já contatados para ele contratar e a grade... E assim foi, e assim está indo.


Pergunta:
Fale-me um pouco sobre _______ [risos]. Fale um pouco sobre o curso de psicologia da USCS.


Resposta:
Olha o curso de psicologia da USCS é a menina dos meus olhos no momento, claro. Porque como eu não tinha feito um planejamento formal, do jeito que todo mundo faz, eu não tive tempo, o que é uma beleza, uma benção, nessa altura do campeonato. Porque se eu tivesse tido tempo para ir atrás... Talvez eu tivesse feito um curso quadradinho como todos os outros institutos tem. Como eu tive que fazer as coisas deste jeito em 30 dias, eu trabalhei a partir da minha experiência. Então o que eu sentia falta... Voltei lá: ‘O que era importante para um aluno de psicologia aprender? O que, quando eu estudei, não fazia sentido? O que precisava, neste momento, ser colocado dentro de um curso de psicologia que não existia ainda? Quais são as novas demandas do mercado de trabalho para um psicólogo?' Eu fui conversando sobre essas coisas. Então eu fui conversar com as minhas colegas que conheço. Tenho uma rede boa de relacionamento com psicólogas, psicólogos que estão em todas as áreas: estão nos consultórios, nos hospitais... Fui atrás de tudo, de todas essas informações e fui conversar com alunos, com pessoas que estavam fazendo psicologia e o que eles achavam do curso, o que eles achavam que faltava. Eu fiz uma conversa durante um mês sobre isso. E aí montei o curso em função da necessidade de quem quer ser psicólogo e não em função do que o mercado dita das regras do que o mercado dita ou tendências e modismos. Fui mesmo em relação a isso. E foi muito bom porque o nosso curso é diferente, nosso curso tem um jeito diferente. Como diz nossos alunos, ele tem uma pegada diferente. Então ele é um curso de psicologia muito moderno, pluralista, generalista, muito diferente do que as outras escolas se propõem a fazer. Por exemplo, é muito comum nas escolas de psicologia você encontrar duas tendências teóricas, apenas duas, psicanálise e comportamentalismo Behaviorismo. As outras abordagens teóricas ficam para quando a pessoa quiser fazer uma pós-graduação, uma especialização. Eles falam bem superficialmente: ‘olha existe isso e existe aquilo', mas eles dão um curso de psicanálise. São cinco anos de psicanálise, ou então são cinco anos de Behaviorismo. E o aluno se vê forçado a ser psicanalista porque não recebeu outra informação na vida ou a ser Behaviorista, porque ele não recebeu outra informação na vida. Então essa era uma das coisas que eu achava que estava furada, que não podia ser dessa maneira. O aluno precisa receber uma formação plural e, no final do curso, escolher que abordagem ele quer seguir. Ele precisa entrar em contato com "Jung", com Rogers, com Binswanger, com __ em análise, com coisas que as outras escolas nem tocam no assunto, né... Porque a psicologia é plural, não é uma ciência fechada ou pronta. A psicologia está se fazendo, está em próprio processo de construção ainda. Existe inclusive uma questão que está sendo discutida agora no Conselho Nacional de Educação: se a psicologia é uma ciência da saúde ou uma ciência humana, porque nem isso ela ainda se decidiu. Ela vem como ciência humana, mas em um determinado momento ela vai trabalhar tanto com saúde mental que agora ela já está se olhando como ciência da saúde. [1:00] E assim, tem prós e contras porque se você entra, não importa qual escolha, qualquer uma das duas que você faça está vendo uma psicologia muito fragmentada, muito parcial. É preciso ter um olhar mais completo a respeito dessa ciência, então tem que olhar para ela como multidisciplinar. Ela é ciência da saúde, ela é ciência humana, ela é ciência social. Não dá para pensar em psicologia que não seja essas três coisas ao mesmo tempo. Então ela difere de uma escola da saúde porque ela não tem só olhar para saúde, até porque psicologia não parte da ideia de que tem que curar. Psicólogos não curam. Psicólogos ajudam a desenvolver conhecimento, a equilíbrio, a saúde psicológica, uma psicodinâmica interna que traga felicidade para aquela pessoa e isso não é cura, isso não tem nada haver com cura. A ideia de cura é medicina, é enfermagem, é fisioterapia que tem esse modelo médico. A psicologia não tem esse modelo médico, ela é uma ciência da saúde diferente das outras, ela é meio diferentona... Mas ela também não é só ciência humana porque ela não vai olhar as questões humanas, existenciais apenas. Ela vai olhar a questão neurológica, a questão do corpo. Desse tratamento do corpo entra essa história também, então não dá para ser só ciência humana porque tem um olhar... E também não é só social, né. Tem que pensar nisso tudo e o curso foi sendo construído com essa cara... Como eu montei a grade... Eu fiz assim, eu montei uma matriz, o curso é matricial. A partir daí ele já é moderno, e esse é meu resquício de consultora organizacional, porque as organizações modernas trabalham com gestão matricial, não trabalham mais com hierarquia... Tem duas coisas que compõem essa matriz no curso de psicologia, uma coisa é o núcleo comum z: que disciplinas, ou melhor, que competências são necessárias para serem constituídas, dentro de um núcleo comum, que qualquer curso de psicologia tem que ter do ponto de vista das diretrizes curriculares nacionais. Tem lá: um psicólogo precisa saber usar os testes psicológicos, saber fazer análises psicológicas das pessoas, aplicar intervenções psicológicas, avaliar, observar... Ele precisa saber gerenciar, participar de equipes multidisciplinares... Tem uma série de competências que a gente chama de núcleo comum. Então eu pus de um lado da matriz essas competências. Do outro lado da matriz, na outra linha, são as ênfases. Dessa forma o psicólogo pode trabalhar na clínica, pode trabalhar na educação, na saúde pública, no sistema público de promoção de saúde e pode trabalhar na neuropsicologia, que é uma demanda muito recente com as doenças neurológicas. As questões relacionadas com dificuldade de aprendizagem, os transtornos psíquicos e os novos transtornos psicológicos que existem são todos neuropsicologia. Essa é a outra linha da matriz, e aí eu fui construindo. Dentro da clínica, o que levaria o psicólogo... Onde está a intersecção de clínica com análise psicológica, com avaliação psicológica. O que está na intersecção de educação com intervenção... E eu fui montando a matriz de tal maneira. E eu não fiz do fundamental para um específico porque isso é muito chato. Como aluna eu achava um porre ter que estudar primeiro filosofia, sociologia, todas as ias, para depois, lá na frente, aprender o que é fazer psicologia. Por isso eu fiz transversal, mesmo. São seis disciplinas por semestre, três são fundamentais, mas três são profissionalizantes. Por isso logo de cara, no primeiro semestre o aluno já está dando de cara com a profissão. [1:05] Ele já está olhando o código de ética profissional, já está olhando mercado de trabalho, logo no inicio, porque aí ele vai cruzando, vai fazendo esses cruzamentos dando um sentido muito melhor do que é ser psicólogo, logo de cara, né.


Pergunta:
Bacana. E, Tânia, nós já estamos chegando à parte final da nossa conversa, mas você citou a pouco que, quando apareceu o papel do jornal do grande ABC, você não conhecia nada desta instituição: ‘Poxa, vou lá e ver no que dá'. Se você tivesse que apresentar a USCS hoje para alguém, como você apresentaria?


Resposta:
Eu acho que essa frase do Santander ficou marcada para mim. Eu acho que apresentaria desta forma: ‘Olha, se você quer vir trabalhar na USCS fique preparado porque vai ficar mal acostumado. A USCS é tão boa para se trabalhar que você vai ficar mal acostumado, e aí vai ser difícil trabalhar em outros lugares'.


Pergunta:
Deixando passar uma aqui, queria que você falasse um pouquinho sobre a rotina do gestor do curso. Você falou bastante da profissão do professor com bastante paixão... E a atuação do Gestor, como ela se dá?


Resposta:
[suspiro profundo] É parecido com ser diretora de escola. Eu fui diretora de escola do ensino fundamental, diretora de escola do ensino médio, com os meninos da fundação, fui gestora na área de administração de pessoas, de gestão de pessoas, na área do RH. Eu fui gestora, gerente de Recursos Humanos, fui gerente de desenvolvimento, gerente de treinamento e desenvolvimento, então estas experiências gerenciais é que eu trago para ser gestora do curso de psicologia... De uma maneira geral o que eu penso da Gestão é que a gente precisa ter... Se a gente pudesse fazer uma receita de bolo, mas receita de bolo não existe para isso... Mas eu tenho pelo menos três valores que eu sigo como gestora, e isso é rogeriano porque eu gosto muito do Carl Rogers. A primeira coisa é que nós precisamos ter apreço pelas pessoas com quem a gente trabalha. Então eu procuro gostar das pessoas com quem eu trabalho, reconhecer o lado com qual eu me identifico, com quem eu me sensibilizo. As pessoas são diferentes, eu não escolhi todas as pessoas, as pessoas passam nos concursos. Os nossos professores são todos concursados, eu não tenho nenhum professor contratado, nenhum no curso de psicologia. Todos eles vieram via concurso. Então, assim, eu não pude fazer escolhas pessoais. Eu estou aprendendo a conviver com essas pessoas e estou aprendendo a ter apreço por elas e eu acho que esse é um valor extremamente importante porque, na medida em que a gente consegue construir uma relação de confiança, uma relação de parceria, a gente trabalha melhor. Esse é um primeiro valor que eu trabalho. O segundo é autenticidade. Eu procuro ser o mais autêntica possível, ser eu mesma em todas as ocasiões, errando ou acertando, mas não me por uma máscara, não me botar numa persona que depois dá um trabalho desgraçado para segurar... Então ser eu mesma, ser espontânea. Às vezes cometer erros por conta disso e atropelar alguns processos por conta disso, já que a espontaneidade, de vez em quando, leva a gente para caminhos não tão formalizados. Mas ser autêntica eu acho que é importante porque o outro sabe o que esperar de mim. A minha equipe de trabalho fala comigo de uma maneira aberta porque sabe que vai tomar um não, ou vai tomar um sim, porque é assim que eu sou, é desse jeito que eu falo e é a maneira que eu lido. Eu sou muito transparente, eu sou muito autêntica nesse sentido... Eu falei isso ontem para um aluno. Um aluno veio dizer para mim: ‘Professora, eu fui promovido para gerente. E agora, o que faço? Qual é a primeira coisa que eu faço?' ‘Seja autêntico. Porque a autenticidade, a transparência, nos dá uma serenidade'. [1:10] É muito mais fácil, muito melhor do que se nós ficamos escondemos coisas, nos escondendo atrás de uma máscara qualquer, de uma persona qualquer e temos que cuidar disso ao invés de cuidar do que a gente tem para fazer mesmo. Não ser autêntico gera muito trabalho, então é melhor ser autêntico por preguiça. [risos]... Acho que a terceira coisa é atualização, é saber. Não dá para você ser gestor de alguma coisa se você não sabe que coisa é essa. Então eu penso que o saber, o saber especializado, o saber técnico, é extremamente importante. Por isso eu procuro me atualizar, procuro ler o tempo todo, saber das leis, da atualização das leis que neste país todo dia muda. Saber da atualização teórica das abordagens, das teorias, dos processos, dos tratamentos que existem, das novas formas de fazer psicologia, eu acho que isso é fundamental. O saber especializado é a terceira coisa que... Eu junto essas três coisas para ser gestora. Então, na verdade, eu acho que não sou gestora, eu sou alguém que facilita o trabalho das outras pessoas. Eu sou uma facilitadora, e não uma gestora.


Pergunta:
Bom, já são 23 anos de USCS que você falou né? Deve ter milhões de histórias para contar.


Resposta:
Tem muita história.


Pergunta:
Tem alguma história na sua cabeça agora? Alguma curiosidade, alguma coisa engraçada, algum momento de maior tensão, algo que seja bacana de deixar para um projeto de memória como esse?


Resposta:
Hm deixe-me ver... O que a gente poderia combinar?


Pergunta:
Dessa vez você pode escolher algo que eu não vá ter que cortar.


Resposta:
É, né, pois é.


Pergunta:
Estou brincando. [risos]


Resposta:
Preciso pensar bem o que eu vou dizer. Eu vou precisar editar esse negócio. [risos]


Pergunta:
Não, é exatamente o contrário. Quero que você seja espontânea, fala o que primeiro vier na sua cabeça. Depois a gente se vira com a edição.


Resposta:
Assim, eu acho que uma das histórias mais interessantes, talvez o que está vido agora que eu acho bacana de contar, é que nesses 23 anos nós fomos criando muitas parcerias, muitas amizades, né. E tem um grupo de amigos no qual metade está na USCS ainda e a outra metade já saiu porque passou em concurso público ou porque... Mas continua saindo para comer pizza uma vez por mês. E assim, quando tem uma coisa para fazer... Sábado passado nós fomos assistir o Fagundes. Fomos ver Baixa Terapia com o Fagundes lá no Tuca. E aí sai para conversar, para bater papo: ‘Ah, porque naquele tempo'... ‘Ah porque você fazia... E agora o que você está fazendo?' ‘Ah, porque fulano'... ‘E aquele fulaninho ainda está lá? Ainda está fazendo aquilo?' Assim, é uma delícia esse legado que fica, sabe? É muito bom. A USCS ela faz... Ela incentiva a gente, ela estimula a fazer essas redes, essas redes sociais, essas redes de amizade. Não importa quanto tempo nós ficamos sem ver um colega, na hora que vemos: ‘Nossa estava pensando em você, o que esta fazendo? Como está?'... ‘Mas olha que bacana, o curso de psicologia'... Tem gente que faz um ano, dois anos, três anos que eu não estou vendo, porque estou em outro campus agora desde que eu voltei, e na hora que encontra a pessoa está torcendo por mim. É uma coisa muito legal, sabe. Então eu acho que isso é muito importante dizer. A USCS tem uma cultura que favorece essas ligações afetivas e que são permanentes, que são estáveis, elas não se desfazem com a fluidez da sociedade líquida. Elas mantêm essa ligação... É um respeito, um afeto que fica. Eu acho que é uma cultura familiar que propicia isso. É o lado bom da cultura familiar, eu acho.


Pergunta:
Para encerrarmos, Tânia, nós falamos das mudanças pelas quais a USCS passou e você chegou aqui em 1995. Dá para traçar um paralelo entre o aluno, lá na sua época quando você entrou na faculdade de psicologia, e o aluno que você encontra hoje em sala de aula? [1:15]


Resposta:
Olha, quando eu entrei na psicologia, as pessoas que estavam no curso tinham uma visão de mundo... Faziam parte de uma sociedade em ebulição. Eu sou da geração de 1968, né, 1968, 1972. Eu entrei na faculdade em 1972, então era um grupo de alunos... Era uma turma de manhã e uma turma à noite. Eram 100 alunos de manhã, 100 alunos à noite e depois, lá pelas tantas, juntaram as duas salas já que as pessoas foram desistindo no meio do caminho, se transferindo... Mas era todo mundo muito ativo. Era uma atividade muito grande, ou por questões políticas, por questões de movimentos _____, movimentos sociais bastante efervescentes. Nós tivemos o DA que foi invadido, nosso presidente de DA sumiu, ninguém nunca mais soube dele. Ele sumiu nos porões da ditadura e a família até hoje não achou o menino. Então era todo um universo completamente diferente, mas as pessoas queriam fazer psicologia quase pelos mesmos motivos: fazer psicologia porque queriam compreender melhor os seres humanos, porque queriam ajudar os seres humanos, porque queriam cuidar. Eram pessoas que estavam interessadas em cuidar de pessoas, de uma maneira geral, e o que eu vejo hoje também é isso. Tem uma diferença da sociedade. Nós vivemos hoje em uma sociedade muito mais individualista, muito mais narcisista, mais consumista. A moçada que vem hoje para o curso de psicologia, em um primeiro momento, está com um olhar querendo entender como é que funcionam os seres humanos, como é o comportamento humano porque querem entender a si mesmos, o que está muito difícil de entender. Lá em 1972, isso também existia, era menor, mas existia por outros motivos: porque eu queria me entender e entender a sociedade para poder fazer um movimento social. Aqui, eu quero fazer tudo isso porque eu quero fazer essa sociedade, quero consumir, quero participar do mercado de trabalho. O foco lá não era só mercado de trabalho, o foco aqui é mercado de trabalho. Então a gente tem mudanças sociais, né. Mas o que eu percebo é que no núcleo comum das duas coisas as pessoas querem cuidar de pessoas. Logo, toda vez que eu faço uma aula inaugural, eu falo exatamente isto aos alunos: ‘Gente, só porque vocês estão aqui neste momento vocês já são dignos de parabéns. Porque vocês fizeram a escolha por uma profissão que cuida dos outros e vocês sabem que é isso. Por mais que vocês tenham vindo aqui para entender seus próprios problemas, com medo de fazer terapia vêm fazer curso de psicologia para não ter que pagar, no fundo vocês sabem que vão fazer uma profissão, que estão começando uma profissão que vai cuidar de pessoas e isso não tem em todo lugar. Não tem gente em todo lugar que quer cuidar dos outros, então isso é muito importante, muito bonito'. A gente estimula muito isso no curso de psicologia, por isso eu acho que a diferença está no contexto social, mas não está no humano. O humano continua querendo cuidar do humano. Pelo menos aqueles que queiram fazer psicologia.


Pergunta:
Algo mais que queira destacar?


Resposta:
Não, eu acho que eu tenho que agradecer. É gostoso estar aqui, falar de toda essa história é uma delícia e realmente emociona contar tudo isso. Deixar saber que isso tudo está sendo gravado, filmado e vai fazer parte da história... Eu acho importante isso. Acho bastante importante estarmos construindo, ter consciência de que nós estamos construindo a história. Isso é muito importante. [1:20]


Pergunta:
É isso aí.


Lista de siglas presentes na transcrição:
UMC - Universidade de Mogi das Cruzes.
USP - Universidade de São Paulo.
PUC - Pontifícia Universidade Católica.
RH - Registros Humanos.
CPD - Centro de Processamento de Dados.
FEBEM - Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor.
ONG - Organizações Não-Governamentais.
USCS - Universidade de São Caetano do Sul.
IMES - Instituto Municipal de Ensino Superior.
FAAP -Fundação Armando Alvares Penteado.
FGV - Fundação Getúlio Vargas.
Unicsul- Universidade Cruzeiro do Sul.
UNINOVE - A Universidade Nove de Julho.
APROXIMES - Associação De Professores E Funcionários Da USCS.
MEC - Ministério da Educação.
DOC - Doença pulmonar obstrutiva crônica.
RH - Recursos Humanos
DA - Diretório Acadêmico


Acervo Hipermídia de Memórias do ABC - Universidade de São Caetano do Sul